O estupro e o vulnerável, entenda

Delegada Rosalina Maria de Almeida
26/04/2018 26/04/2018 15:16 1014 visualizações

A liberdade sexual é um dos direitos do cidadão, não podendo, a pessoa, ser constrangida ao realizar sexo com quem seja ou de modo que não queira. Com o objetivo de proteger este direito, a legislação penal criminalizou alguns atos, trazendo penas para condutas que o legislador considera como afrontas que lesam a liberdade sexual.


Temos o estupro propriamente dito, que é o cometido contra a pessoa maior e capaz, cujo crime é o constrangimento à pessoa, mediante violência ou grave ameaça, fazendo-a praticar qualquer ato libidinoso com outrem. Inicialmente, faz-se necessário esclarecer que ato libidinoso é qualquer ato sexual, independente de qualquer penetração propriamente dita, seja através de conjunção carnal (penetração do pênis na vagina) ou coito anal (penetração do pênis no ânus). Desta forma, o estupro se consuma com a prática, mediante violência ou grave ameaça, de qualquer ato que traga prazer sexual para o criminoso.


Existe ainda no Brasil um resquício de um dispositivo legal revogado pela Lei 11.106 de 2005, que considerava como causa extintiva da penalidade, o casamento da vítima com seu algoz, nos crimes sexuais. Isso trazia, para a vítima, a pena de ter que viver pelo resto de sua vida com seu estuprador, e para o criminoso, a extinção da pena.


Atualmente, mulheres e homens têm direitos sexuais iguais, mas nem sempre foi assim. A mulher tinha uma maior proteção até o advento da Lei 12.015 de 2009. Isso mesmo. Até 2009, somente as mulheres poderiam ser consideradas como vítimas de estupro. Todavia, havia a figura do atentado violento ao pudor, que contemplava a proteção ao homem aos atos libidinosos diversos de conjunção carnal cometidos mediante violência ou grave ameaça,  excluindo, assim o homem da proteção às conjunções carnais de que era vítima, ainda que constrangidos a tal ato, mediante violência ou grave ameaça. Tal dispositivo legal (atentado violento ao pudor) deixou de existir, abarcando, agora, o estupro, todos os atos libidinosos cometidos com violência ou grave ameaça, sendo hoje possível que a vítima seja tanto homens, quanto mulheres.


Existe, ainda, dentre outros crimes que penalizam alguns atos sexuais específicos, o estupro de vulnerável. O artigo, previsto hoje no Código Penal por meio do Artigo 2017-A, também foi uma alteração legislativa trazida pela Lei 12.015 de 2009. Através deste artigo, é considerada a conduta de “ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”, mas também realizar qualquer ato sexual “com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tenha o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não possa oferecer resistência”.


Inúmeros casos são veiculados todos os dias na imprensa, divulgam casos curiosos de atentados contra a liberdade sexual de pessoas vulneráveis. Inicialmente, é preciso esclarecer que a pessoa vulnerável, é aquela que, motivada pela idade (de 0 a 14 anos incompletos), ou por qualquer motivo temporário ou definitivo, que traga a impossibilidade da pessoa, do discernimento sobre o ato que está praticando, ou, de qualquer modo, não possa oferecer resistência.


É fácil, desta forma, entender que qualquer ato que traga prazer sexual, praticado com pessoas (do sexo feminino ou masculino), cuja vítima ainda não tenha 14 (catorze) anos, é crime de estupro de vulnerável, independentemente de seu consentimento.


Com relação às demais condutas que caracterizam o crime abordado no texto do artigo 217-A do Código Penal, há inúmeros exemplos. Para melhor compreensão: o ato libidinoso praticado com pessoa enferma ou doente mental, cujos problemas de saúde incapacitem a vítima quanto ao discernimento de seu ato e o praticado com uma pessoa que, de qualquer modo, não possa oferecer resistência, como um caso de embriaguez ou sob efeito de drogas. Podemos, então, entender que o vulnerável no âmbito do ato libidinoso, é aquele incapaz de discernir ou oferecer resistência ao ato praticado.


Rosalina Maria de Almeida é Delegada de Polícia do Estado do Tocantins, especialista em Direito Público.